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quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Galactolatria: mau deleite"

Filósofa Sônia Felipe lança livro que revela os malefícios do leite

08 de outubro de 2012 às 6:00


(da Redação)
Colaboradora da ANDA, Sônia T. Felipe assina a Coluna Questão de ética há quase quatro anos. Seu livro, Galactolatria: mau deleite, é um texto voltado à questão da extração do leite bovino e seus desdobramentos nocivos à vida e ao bem próprio das vacas, à saúde ambiental e humana.

O livro “Galactolatria: mau deleite” foi impresso em papel reciclado (Foto: Divulgação)

 

Tornar-se vegana, rodeada por onívoros e por comedores ainda afeiçoados à ingestão de alimentos produzidos a partir da secreção da glândula mamária das fêmeas bovinas, é uma decisão que requer alguma determinação da vontade. Para nutrir tal determinação ética, a filósofa Sônia T. Felipe fez um percurso de leituras fora do cenário filosófico, investigando a literatura especializada (médica e técnica), para obter os dados e informações que tecem a rede da galactolatria, apresentados aos leitores de língua portuguesa de modo claro e fluente neste livro.
O título da obra Galactolatria: mau deleite (idolatria do leite, vista como um mau deleite), lançada nas redes sociais em 4 de outubro de 2012 (dia consagrado a São Francisco), foi criado para designar a adoração que grande parte das pessoas tem pelo leite e, mais comumente, por seus derivados (iogurtes, queijos, cremes, manteiga, ghee).
Mas não é apenas no título da obra que encontramos um termo grego. Cada um dos cinco capítulos dessas 304 páginas carregadas de informação e da concepção abolicionista vegana, vem nomeado por um neologismo criado a partir do grego: Galactoética (a descrição crítica do sofrimento das vacas e vitelos no sistema de extração do leite); Galactopoese (a descrição da composição do leite bovino e a comparação entre a constituição original do leite de diferentes fêmeas); Galactogenia (a reunião das declarações de médicos contrários à ingestão do leite bovino por humanos em qualquer idade, sobre os males associados ao consumo do leite e derivados); Galactocracia (a apresentação dos dados da extração do leite em cada país e o montante em cada continente, com a respectiva montanha de excrementos que essa produção representa); e, por fim, Galactoclastia (uma espécie de conclusão, alusiva ao ato da quebra dos ídolos que impedem a visão da realidade).
O livro, impresso em papel reciclado, traz um índice remissivo com mais de 500 verbetes, facilitando a busca por tópicos e termos, e uma lista da produção bibliográfica da autora, além de 602 notas referindo as fontes usadas. A capa, criada por Victor de la Rosa especialmente para a obra, é pura arte, na qual tetos e úberes encavernados estão sutilmente referidos em suas materializações deformadas. A diagramação, de Maurício Varallo, está impecável. No Prefácio, a autora agradece nominalmente a quase todos os defensores dos animais brasileiros, servindo este texto, por si só, como um registro histórico do que há de mais representativo no Brasil em termos de defesa animal abolicionista. A apresentação deste livro ficou a cargo da ativista feminista dos direitos animais, vegana e abolicionista, Tamara Bauab Levai.
Os termos do grego, por quê?, perguntamos. Não havia termos em português, para designar este livro e cada um dos capítulos? “Não”, responde-nos a autora. “Os termos precisaram ser criados, exatamente porque o espírito do livro foge ao padrão que o tratamento do leite recebe na literatura convencional. Este livro”, enfatiza Sônia T. Felipe, “não é uma apologia à ingestão do leite bovino por humanos. É, acima de tudo, um livro que informa o consumidor sobre a realidade disfarçada por trás da brancura do leite. Uma realidade nada branca, brutal. É um livro em defesa das fêmeas bovinas usadas no sistema de extração do leite. Um livro para quem deseja despertar sua consciência ética animalista”, conclui a autora.
Mas, se as pessoas param de ingerir leite de vaca, isso não as deixa doentes? A resposta de Sônia T. Felipe é firme e direta, aliás, seu estilo de escrita: “Se as pessoas não gostam de alimentos de origem vegetal que contêm os nutrientes que o leite conjuga, e se elas não comem os alimentos vegetais que contêm cálcio, gorduras saturadas, açúcar e vitaminas, então, sim, elas adoecem”.
O leite contém tudo isso, mas contém também o que não convém à saúde humana: caseína, hormônios bovinos, resíduos de antibióticos (dados às vacas por conta da inflamação do úbere e dos cascos), pus, nitratos, nitritos, lactose e resíduos dos pesticidas usados na produção dos grãos e cereais que elas são forçadas a ingerir para disparar a secreção mamária. O leite produz gás metano, que causa imensa dor às vacas, quando não expelido, e destrói a camada de ozônio quando emitido na atmosfera.


A autora Sônia T. Felipe (foto) foi motivada pela busca de dados contrários ao mito da necessidade de leite bovino para o sustento do organismo humano (Foto: Divulgação)
“Somados esses ingredientes maléficos do leite, que não aparecem na descrição de sua composição na caixinha ou saquinho, muito menos nas embalagens dos queijos, manteiga e iogurtes”, afirma Sônia T. Felipe, “esse, definitivamente, não é um alimento saudável para os humanos, se é que tal composição é saudável para os bezerros. A vantagem, para a maior parte dos bezerros, é que eles são impedidos de mamar o leite de sua mãe. São os humanos que ingerem essa coisa, não eles!”
O que a levou a escrever o livro? Diferentes razões, responde a autora. A mais forte foi a busca, na literatura médica norte-americana, e na literatura técnica canadense, neozelandesa e britânica, de dados contrários ao mito da necessidade de leite bovino para o sustento do organismo humano. Essa busca começou com a decisão de parar de ingerir tudo o que é derivado de animais, há mais ou menos 14 anos.
À época, esclarece Sônia T. Felipe, ela havia parado de comer carnes por 10 anos. A decisão de tornar-se genuinamente vegetariana foi fundamental para a busca da literatura de ajuda na condução da própria dieta, porque há uma década e meia atrás, não havia médico ou nutricionista que soubesse orientar uma pessoa na condução de uma dieta vegana. Hoje já os há. Mas o número é ínfimo, comparado ao número de pessoas cheias de mazelas, no Brasil, devidas, provavelmente, à galactomania. Mas os médicos continuam a ignorar isso em seus estudos de medicina. Eles se formam pelo padrão galactófilo. “É triste, mas é verdade! Poucos médicos podem ajudar pacientes na condução de uma dieta vegana, porque eles estão convencidos de que sem alimentos de origem animal não se pode ter saúde. Isso ainda precisa ser desconstruído. A gente não tem muito tempo para ficar esperando por essa mudança”, diz a autora. “Então, o negócio é buscar as informações onde elas já estão registradas. Foi o que fiz”, conclui a autora, “e agora coloquei todas essas informações à disposição das pessoas. Procurei escrever da forma mais clara e direta possível, acrescenta a autora, justamente para facilitar a leitura também de pessoas que costumam ler muito pouco. O livro é importante para todas as pessoas”, declara a filósofa.
Sônia estava realizando seu pós-doutorado em Bioética – Ética Animal, na Universidade de Lisboa, em 2001, quando leu pela primeira vez a obra de John Robbins Diet for a New America, na qual o autor desmistifica o consumo de leite bovino como forma de proteção contra a osteoporose. Depois veio a leitura da obra mais importante já escrita até hoje, sobre a associação da caseína (proteína do leite) ao câncer, The China Study, escrita por Colin T. Campell & Campell II, e a desmistificação do cálcio contido no leite bovino como remédio contra a osteoporose. “Justamente esse mal é o que assusta a maior parte das pessoas quando se fala em abolir o consumo de leite”, salienta a autora.
“Há quase 12 anos”, continua, “com a leitura desses livros, comecei a tomar notas das informações relevantes para seguir a dieta vegana. Nesse intervalo, conclui, publiquei o Por uma questão de princípios: alcance e limites da ética de Peter Singer em defesa dos animais (Boiteux, 2003), e Ética e experimentação animal: fundamentos abolicionistas (Edufsc, 2006), ambos dedicados à questão dos animais”.
Àquelas leituras somaram-se outras, intercalando a de livros dos médicos que fazem parte do Comitê dos Médicos por uma Medicina Responsável, criado por Neal Barnard e formado por mais de 6.000 médicos que seguem um padrão de dieta estritamente vegana (plant based foods) no tratamento e cura de todas as doenças, das cardiopatias graves ao câncer. “E, no Brasil, foi um alívio a publicação dos livros dos médicos, Eric Slywitch, Marcio Bontempo e Alberto Peribanez Gonzalez, todos dispensando da dieta os alimentos animalizados”, ressalta a autora.
Foi baseada na literatura inglesa, no original, e de posse de informações escondidas do público não versado em inglês, que a autora tomou a decisão de escrever Galactolatria: mau deleite, possibilitando, finalmente, aos brasileiros, saber algo mais sobre o leite bovino, algo que não está escrito nas caixinhas, saquinhos e embalagens de laticínios levados do supermercado para casa.
O que as pessoas podem esperar do livro?, perguntamos. “Informações fundamentais para orientar suas decisões morais relativamente à ingestão de leite e laticínios”, foi a resposta. E o que as pessoas não devem esperar deste livro? Nas palavras da autora, elas não devem esperar qualquer orientação específica nas questões dietéticas. Este não é um livro de dieta. Tampouco é um livro de nutrição (embora devesse ser lido por todos os nutricionistas e seus pacientes!), não é um livro com dicas para curar isso ou aquilo. É um livro de filosofia crítica da alimentação galactófila. Um livro de ética, que urge ser lido. As vacas agonizam, os vitelos agonizam, o planeta agoniza, afogado em tanto excremento. O objeto dessa ética é a vaca e o que a exploração letal dessa fêmea representa, contra seus interesses fundamentais, os interesses do ambiente natural e os da saúde humana.
Se o livro é crítico, a quem essas críticas se destinam? Sônia esclarece que a crítica se destina a cada um que come o que lhe é imposto, pela propaganda ou pelo hábito familiar, sem se perguntar pela origem e a pegada desse alimento; a cada profissional que prescreve o leite na dieta das pessoas, como se ele fosse remédio, quando na verdade, para muitas, ele é nocivo; a todos os que ingerem leite e derivados, sem calcular o montante de cereais e grãos que foi dado de comer às vacas, o montante da água potável que é dada às vacas, e, lamentavelmente, o montante (equivalente ao da água e comida ingeridas) que elas excretam.
Parte do texto de Galactolatria: mau deleite é dedicada a apresentar os cálculos daqueles montantes. Cada leitor pode agora saber quanto cereal, água e excrementos uma inocente fatia de queijo em seu sanduíche representa para o planeta. Segundo Sônia T. Felipe, não haverá movimento ambientalista genuíno, em nosso país, ou em qualquer outro, enquanto os próprios ambientalistas continuarem a ingerir leite e laticínios, ignorando os dados que estão neste livro.
Há elogios? A quem eles se destinam? Não há elogios. Na opinião da autora, ainda estamos longe de merecer elogios por nossos hábitos alimentares. O momento não é para festejar nada, ainda. Mas há esperanças. “Por vias distintas”, concede Sônia, “há muitas pessoas que já tomaram decisões morais no quesito alimentação. Acho que Galactolatria: mau deleite vem para dar novo alento aos defensores dos animais, aos veganos abolicionistas, declara a autora. Mas não apenas a eles. Este livro também pode ser de grande alento para todas as famílias que têm membros sofrendo as mazelas da ingestão do leite bovino. E, por fim, este livro pode ajudar muitos vegetarianos, que ainda ingerem laticínios, a tomarem a decisão final de abolir de sua dieta esses alimentos, por uma questão de coerência ética”, enfatiza Sônia T. Felipe.
À questão de se as mazelas, que podem ser atribuídas à ingestão do leite, são comuns, no Brasil, ou apenas em outras sociedades, Sônia responde, sem rodeios: “o que ainda não é comum é as pessoas saberem que suas mazelas podem dever-se à ingestão do leite bovino e seus derivados. Dada a composição racial brasileira (afro, asiática, judaica, indígena, árabe e outras), não seria de espantar se, de cada 100 pessoas, umas 70 fossem diagnosticadas como intolerantes ao leite, não apenas porque em seus organismos cessou ou diminuiu a produção da lactase, a enzima responsável pela digestão do açúcar do leite, mas também pelas proteínas bovinas que nosso sistema digestório não evoluiu para bem digerir, ou mesmo pela composição maléfica do leite, conforme referido acima”, alerta Sônia.
“Na evolução humana”, prossegue a autora de Galactolatria, “o leite bovino não é um alimento essencial, embora ele seja adotado em vários continentes. Entretanto, a maioria dos humanos (orientais, indígenas e africanos) não o ingere na forma pasteurizada e homogeneizada, apenas na fermentada. Somente algumas heranças genéticas (caucasianos e poucas tribos africanas com tradição milenar na criação do gado bovino) mantêm a produção da lactose após a primeira dentição, e, ainda assim, nem todos”, afirma Sônia. “Essas pessoas continuam a ingerir leite sem padecer dos males comuns àqueles que não o podem digerir direito. Mas isso está fartamente explicado em Galactolatria. Vamos, então, à leitura?”, conclui a autora.
Serviço:
Galactolatria: mau deleite
Sônia T. Felipe
Ecoânima, 2012
304 páginas
Preço: R$45,00 + frete
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O livro também pode ser adquirido pela ANDA. Basta enviar uma mensagem com seu pedido para faleconosco@anda.jor.br.

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